Nos últimos cinco anos, fiz cinco viagens longas. Foram nove meses na Ásia em três etapas e cinco meses entre México e América Central em duas empreitadas. Nas rodinhas de amigos, esse assunto gera reações das mais diversas. Uns acham que tenho a vida que todo mundo pediu a deus. Outros, que sou uma espécie de neohippie pós-moderna supermaluca. Cabeças mais analíticas buscam razões mais profundas: “ela foge dos problemas que não quer resolver”. Almas capitalistas fazem cálculos imaginários tentando saber como as minhas contas fecham.
Palpites e opiniões à parte, todos perguntam: você não se cansa? Talvez um dia eu canse de focar a energia nisso (qualquer dia vou contar pra vocês como é a minha vida para que eu possa fazer essa “loucura” uma vez por ano). Mas as viagens longas em si não precisam ser cansativas. Ou melhor: viajo com tempo justamente porque gosto de viajar com calma.
Ao invés de saltar entre 10 países diferentes porque tenho três meses, prefiro investir todo esse tempo em conhecer melhor um país ou uma região. Quando gosto, me permito ficar quinze, vinte dias em um lugar só, como se quisesse ter uma mini vida em cada cidade que amo.
Numa viagem de uma semana, saímos de casa com uma certa programação mental. Quando temos quatro meses pela frente, a fórmula é outra. Você se prepara para desconectar por mais tempo, para tentar sentir menos saudades de tudo e de todos, para pensar nas alegrias e nos problemas do seu dia a dia com menos frequência. Não me perguntem exatamente como faço isso. Mas funciona.
Quando meu irmão era pequeno, teve um ataque de chatice durante uma viagem familiar ao Rio de Janeiro. Minha mãe se desdobrava para entretê-lo e, quando achávamos que estaria no auge da empolgação, ele soltava a pérola: “qué i pa casa”. O “qué i pa casa” é uma piada interna da família até hoje. Nessas minhas longas andanças, só entrei no modo “qué i pa casa” nos últimos dias da viagem.
E do que eu sinto saudades quando, finalmente, canso? Da família, dos amigos, do cheiro do meu travesseiro, do meu banheiro… Mas tudo isso é óbvio demais, certo? Entre as saudades inesperadas reina a da delícia de ter um dia sem absolutamente nenhuma grande emoção ou decisão a ser tomada (você já pensou em quantas pequenas coisas tem que decidir ao longo de uma viagem?).
Materializo esse estranho sentimento com a imagem de estar atirada no sofá, embaixo das cobertas, vendo qualquer besteira na televisão, praticamente lobotomizada – e sem me sentir culpada por causa disso. Simples assim. Deve ser porque viajar também é aprender a curtir as coisas que parecem insignificantes no nosso cotidiano.
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