Como é ir à praia na Espanha nos tempos de coronavírus
Vitrines de acrílico entre espreguiçadeiras, hora marcada com apps e outras iniciativas mirabolantes não vingaram
Em meados de junho, quando a Espanha estava prestes a entrar no seu processo de “desconfinamento”, a pergunta estava no ar: como controlar a lotação das praias no verão de 2020? Após meses de lockdown, esperava-se que a volta à beira-mar fosse ter jeito de estouro da boiada e ideias mirabolantes estavam no centro das atenções. Falou-se de espreguiçadeiras separadas por paredes de acrílico, hora marcada para esticar a canga através de aplicativos, lotes delimitados, tempo máximo de permanência. Praticamente nada disso aconteceu.
Contagem por câmera e drones
No geral, o controle acabou sendo feito de uma forma bem menos ostensiva e pirotécnica do que a esperada. Até porque todas as iniciativas mirabolantes que foram levantadas implicavam alto investimento. Some-se a isso as evidências de que o risco de contágio em ao ar livre é baixo, o que fez com que o problema das praias passasse a ser, de certa forma, secundário.
Em Barcelona, onde a lotação à beira do Mediterrâneo pode ser extremamente crítica, a prefeitura cercou temporária e precariamente algumas praias, estabeleceu pontos de acesso e implantou um sistema de contagem aproximada de pessoas através de câmeras de vigilância. Em determinados momentos, quanto o número de gente extrapola os limites considerados seguros, a praia é evacuada ou interditada. Na Galícia, algumas cidades estão fazendo esse monitoramento com a ajuda de drones equipados com autofalantes. Máquinas estampando quadradinhos na areia até foram usadas em certas regiões, depois acabaram esquecidas, porque obviamente era um esforço inútil.
Questão de bom senso
Já nas Ilhas Baleares, um dos principais destinos internacionais para dias de sol e mar na Espanha, e em várias outras regiões, os governos locais apelaram para o bom senso das pessoas. No fim das contas, a responsabilidade individual é o fator mais importante para o controle da pandemia que estamos vivendo. Em Ibiza, Mallorca e Menorca, cartazes discretos na entrada das praias estabelecem as regras: distância de 1,5 metros entre cada grupinho de, no máximo, 25 pessoas (número que acaba de ser reduzido a 10), proibição de esportes de contato, entre outras medidas. Mas não há nenhum tipo de fiscalização para que essas normas sejam cumpridas.
Contar com o bom senso do ser humano é sempre algo bastante arriscado. Mas, por incrível que pareça, nas areias por onde passei, fui testemunha do comportamento exemplar da grande maioria das pessoas. Ainda que o uso de máscara na praia (e seu entorno) não seja obrigatório nas Ilhas Baleares (como acontece no País Basco, por exemplo), diria que mais da metade das pessoas vêm fazendo uso voluntário do “acessório” pelo menos para chegar e ir embora. É claro que sempre tem aquele sem noção que insiste em colar em você, mesmo quando há espaço de sobra. Mas, atualmente, pelo menos rola reclamar quando isso acontece, sem risco de parecer maluco.
Turismo em baixa
Joga a favor desse bom senso o fato do turismo internacional em toda a Espanha ter sido reduzido ao mínimo neste verão. Aqui em Menorca, tenho sempre a sensação de que se houvesse uma pessoa a mais na ilha, o distanciamento nas praias já não seria possível. Em um cenário hipotético (e improvável) de que as pessoas voltem a viajar normalmente com o vírus ainda circulando, não vai ter app, barreira de acrílico ou barreira física que impeça o espreme-espreme.
Para o próximo verão no Brasil, a única aposta possível é no seu bom senso. E isso passará por escolher um lugar ao sol onde seja possível encontrar o distanciamento necessário. Se os espanhóis conseguiram isso com certo sucesso em um país com o litoral extremamente saturado, os brasileiros podem perfeitamente ocupar de forma racional mais de 7 mil quilômetros de costa. Seja criativo.