O continente europeu não produzia chás até bem pouco tempo atrás por duas razões principais: o clima não é dos mais propícios e o processo de produção é extremamente lento – é preciso esperar pelo menos cinco anos até a primeira colheita, para se ter uma ideia. Pois desde 2019 o cenário mudou graças a um casal destemido e apaixonado pela bebida: a alemã Nina Gruntkowski, ex-jornalista, e o português descendente de holandeses Dirk Niepoort, um nome intrinsecamente ligado ao universo do vinho do Porto.
Fãs incondicionais de um bom chá verde à moda oriental, Nina e Dirk começaram plantando 200 pés de Camellia Sinensis no jardim de casa, no Porto, em 2011, como teste. Deu tão certo que três anos mais tarde as plantas foram transferidas para um antigo terreno vinícola ao norte da cidade, na região de Fornelo, e ganharam a companhia de outras 12 mil. Nascia assim a Chá Camélia.
A primeira colheita oficial aconteceu em 2019 – e, desde então, tem sido 100% manual. Todo o processo é artesanal e o chá, orgânico. Na estreia, 60 quilos de folhas frescas deram origem a 12 quilos de chá. No ano passado, a produção já somou 50 quilos de chá.
A descoberta do fantástico terroir português dos chás verdes contou com a preciosa ajuda de um casal japonês que há quatro décadas se dedica à produção no sul do Japão e que iniciou um precioso intercâmbio com Nina e Dirk – eles vêm a Portugal, o casal vai ao Japão e o chá só melhora. Um pouco desta fascinante viagem é contada por Nina num workshop online com direito a degustação de três tipos de chá. Um programa delicado e fascinante do qual participei no último sábado.
Os workshops duram cerca de duas horas e meia e podem ser feitos de qualquer canto do mundo (na minha turma tinha gente até em Macau!). Anote na agenda: a próxima data é 27 de Março. Sempre que a geografia e as fronteiras permitem, são enviados chás para os participantes degustarem ao mesmo tempo, na companhia da anfitriã – e com dicas preciosas. Aprendi, por exemplo, que a qualidade e a temperatura da água são fundamentais para cada tipo de chá.
A viagem começa pela quinta no norte de Portugal. Pausa para o Luso Chá, que deve ser preparado com água a 80ºC por três minutos. As impressões e notas da degustação chegam da Alemanha, da Lituânia, de Sintra. O tour continua pelo Japão, seguido pelo toque reconfortante do Houjicha. Na terceira etapa, o casal produtor japonês vem a Portugal e Nina revela um segredo: vem estudando japonês há oito anos para poder se comunicar melhor com eles. Um brinde virtual de Sencha com Matcha sela o encontro. A grande surpresa fica para o final, quando a paulistana Erika Kobayashi, parceira de Nina e minha velha conhecida dos seus tempos de jornalismo, conduz uma autêntica cerimônia do chá do outro lado da tela. Estamos todos em silêncio, inebriados, conectados.
É fato e é preciso comemorar: Portugal, que até então só produzia chá numa ilha longínqua dos Açores, fincou o pé no mapa dos produtores mundiais de chá verde de alta qualidade, de inspiração oriental. Em condições normais de temperatura e pressão, a plantação do Chá Camélia pode ser visitada, com degustações in loco. A boa notícia enquanto a pandemia não dá uma trégua e as fronteiras não abrem? Os chás já são distribuídos no Brasil pela Tea Road.