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Viajante sincero, Montevidéu

Você pode, sim, simplesmente não gostar daquilo que a maioria das pessoas amou, ou você pode apenas estar num dia ruim

Por Ana Claudia Crispim
Atualizado em 2 jan 2023, 17h07 - Publicado em 12 ago 2014, 17h00
@waldirpc
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“Não é você, sou eu. Você é a pessoa certa na hora errada, blá, blá, blá…”

Quem nunca proferiu estas ardilosas palavras, nem que fosse com as melhores das intenções? Penso nisso quando viajo pra algum lugar que é unanimidade e não acho tudo aquilo. Na volta da viagem as pessoas que foram pra aquele lugar (e adoraram) nos espremem em busca de elogios e identificação. E a gente não tem coragem de falar que simplesmente não gostou, nunca vai gostar! Se você já sentiu isso e nunca teve coragem de falar, liberte-se, vem comigo, tira esse sapo engasgado na goela. Você pode, sim, simplesmente não gostar daquilo que a maioria das pessoas amou, você pode apenas estar num dia ruim. Talvez fosse o lugar certo na hora errada, talvez não seja o lugar, e sim você… 


Montevidéu
Comida excepcional, carne mais gostosa ainda que a da Argentina (se é que isso é possível), o melhor doce de leite do mundo e a mesa quase sempre enfeitada com a bebida típica e deliciosa, o clericot. A cidade tem lindos prédios antigões, abandonados. Vintage. As ruas são bonitas, as pessoas, educadas, e o rio da Prata banha tudo isso. Ê, beleza! Ê, beleza? Ê, beleza, nada!

Eu gosto de frio e resolvi ir pra lá no inverno. Achei que seria romântico, que os cafés me abraçariam e que eu gostaria deles. Mas a cidade estava cinza, o rio da Prata parecia um mar triste, apocalíptico. O vento? Nunca vi nada igual.
Pra piorar conhecemos um senhor supersolícito que estava carente, era recém-separado. Meu marido, no afã de fazer amizades nativas e com medo de contar pontos negativos no carma, nos colocou na maior fria do mundo, deu bola. E o amigo resolveu passear com a gente. Sim, ele passeou com a gente to-dos-os-di-as, e não havia quem tivesse a coragem de cortar o barato de um homem solitário. Isso, o frio e o cinza foram transformando a viagem numa depressão sem fim. Os prédios antes fotogênicos ficaram tristes, o canto dos pássaros parecia fúnebre, a comida perdeu o sabor.
Um dia não tive forças para sair do quarto, o hotel era bom, a cama, fofa, e tinha bacon no café da manhã; pra que mais?

Dizem que no verão a cidade ganha cor, não sei nem nunca vou saber. Dizem que o índice de suicídios no Uruguai é alto demais, e eu entendo o porquê. Na época não tive tanta coragem de dizer, não queria magoar uma (fofa) amiga uruguaia. Pra que magoar se a gente pode evitar, não é? Mas acabei contando que não foi legal, e não foi mesmo.

Um amigo acabou de dizer que comprou passagens pra lá. Desejei boa sorte e ofereci antidepressivos.

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