Copa, Cristo, comida
Não bastava ser o lugar mais bonito do Brasil. O Rio de Janeiro agora quer ser a cidade em que estão os melhores restaurantes do país
Combine um pouco de mar, calçadão, biscoitos Globo, hospitalidade, uma parte de caipirinha e outra de chope sem colarinho. Reserve. À parte, mescle uma subida ao Cristo, um passeio de bondinho e, se for época, um lugar na areia para ver os fogos. Ao juntar tudo você tem a receita básica para uma viagem à Cidade Maravilhosa. Quer dizer: tinha. A fórmula para conhecer bem o Rio de Janeiro mudou – e está muito melhor. Agora é preciso acrescer um tempero sofisticado: a cena gourmet local.
Em obras para a Copa de 2014 e para as Olimpíadas de 2016, declarado Patrimônio Mundial da Unesco, o Rio está altíssimo-astral também na cozinha. Abriga boa parte dos restaurantes com estrelas do país, a distinção concedida pelos GUIAS QUATRO RODAS. Para 2013, espera-se a chegada da primeira unidade brasileira da veneranda escola de culinária fancesa Le Cordon Bleu. E, para quem pensa que as boas mesas do Rio estão todas no Leblon, é hora de olhar para Botafogo e Humaitá, onde um novo eixo do sabor surgiu na Rua Conde de Irajá.
Não parece bizarro agora discutir se no Rio se come melhor do que em São Paulo, a outrora indisputada capital gastronômica do país. A cada D.O.M. e a cada Kinoshita o Rio responde com os seus Sudbrack e Mr. Lam. Talvez seja melhor pensar em ficar na ponte aérea. Foi o que fizeram Carlota, Ráscal, Gero, Le Vin Bistrô, Bráz e Fasano, presentes nas duas cidades. A seguir, a VT mostra grandes “ingredientes” cariocas: seus restaurantes imperdíveis, os novos e até uns cultuados. E, para mexer em time que está ganhando, fechamos com os neobotecos, que estão renovando a cena clássica dos botequins do Rio.
A chef Roberta Sudbrack – Foto: Leo Feltran
Os imperdíveis
Arroz, feijão, purê de batata, camarão com chuchu… Foi com receitas prosaicas que a chef Roberta Sudbrack alimentou nossos atletas nas três semanas que passou em Londres, cozinhando no centro de treinamento da delegação olímpica do Brasil. Uma “comida do dia a dia” que passa longe dos ousados menus degustação que lhe renderam três estrelas e o título de Chef do Ano no GUIA BRASIL 2012 – além de uma inédita aparição no ranking dos 100 melhores do mundo da revista Restaurant. Ex-estudante de veterinária e ex-chef do Palácio da Alvorada nos anos FHC, a gaúcha muda os menus toda noite, sempre priorizando o uso de produtos orgânicos e sazonais. Ela também tem mania de reabilitar ingredientes deixados de escanteio, como maxixe, quiabo e cará.
Parece contrassenso, mas dá para chamar sua comida de “comfort food contemporânea”, com a técnica minimalista a serviço de uma cozinha afetiva, induzindo epifanias gustativas. A refeição pode começar pelo curau cremoso com caviar e pele de banana assada, em que o salgado das ovas acentua a doçura da futa e do milho. Depois surge, quem sabe, um ravióli de chantilly de batatas com bottarga, um pargo em compota de milho doce, um pato braseado em futas secas. No fim, o café e a conta são precedidos por sobremesas como canelone de maçã com farinha de pistache ou pelo delicioso sorbet de goiaba, que, em sua simplicidade, encerra a noite com brilho. (Avenida Lineu de Paula Machado, 916, 21/3874-0139; Cc: D, M) (BRUNO LEUZINGER)
Em uma charmosa casa de esquina no Jardim Botânico, Claude Troisgros mostra os saborosos resultados da mistura de técnicas fancesas e ingredientes brasileiros, combinação que parece banal hoje, mas que ele viu que daria samba muito lá atrás, ainda nos anos 1980. Seu Olympe tem a cotação máxima do GUIA BRASIL 2012, mas a dedicação que Troisgros devota ao restaurante não o impede de também tocar uma rede gourmet que leva suas iniciais e apresentar o reality show Que Marravilha!, no canal GNT. No Olympe, Claude e seu filho Thomas cuidam do requisitadíssimo menu confiance de cinco etapas. Há também um cardápio regular com algumas marcas registradas da casa – entre elas, cherne com banana-d’água, molho de passas e purê de batata-baroa. (Rua Custódio Serrão, 62, 21/2539- 4542; Cc: A, D, M, V)
Não existe no Brasil um bufê de saladas mais famoso do que esse. Nem mais caro: o quilo custa R$ 106. À mesa, distribuem-se misturas diferentes, sempre leves e com jeitão saudável, a exemplo do fusilli ao pesto com iogurte e do trigo com maçã e aipo. A clientela escolhe algumas das saladas no bufê e as combina com quiches ou pratos quentes sugeridos no dia, à base de massa e carne vermelha ou branca. Mesmo almoçando em um ambiente invariavelmente cheio, todo mundo parece sair da casa levando um sorriso no rosto e, na sacola, um dos pães e bolos que repousam quentinhos nas prateleiras perto do caixa. Ah, o Leblon… (Rua Dias Ferreira, 199, 21/2274-7843; Cc: D, M, V)
Mais Imperdíveis
ANTIQUARIUS Antes dos pratos de bacalhau ou do famoso arroz de pato, divirta-se com o couvert: bolinho de bacalhau, croquete de carne, pães frescos, berinjela com molho de tomate… (Rua Aristides Espínola, 19, 21/2294- 1049; Cc: A, D, M, V)
LE PRÉ CATELAN Dentro do Hotel Sofitel, é comandado pelo chef Roland Villard, entusiasta dos ingredientes brasileiros e que também estrela um menu degustação privê a R$ 410. (Avenida Atlântica, 4240, 21/2525-1160; Cc: A, D, M, V)
MR. LAM O melhor chinês do Brasil tem na decoração guerreiros de Xian e um motor de lancha, cortesia do patrão Eike Batista. Do cardápio, assinado pelo chinês Sik Chung Lam, o tal Mister, peça os satays (espetinhos) de frango e depois o Mr. Batista’s Prawns (camarões ao molho agridoce) ou o tradicional pato laqueado. (Rua Maria Angélica, 21, 21/2286-6661)
As novidades
Tratado como “o mago da cozinha” no quadro que apresenta desde julho no Fantástico, Felipe Bronze sabe como poucos rezar pela bíblia espetacular da cozinha molecular difundida pelo catalão Ferran Adrià. No programa, esbanja intimidade com o uso de nitrogênio e técnicas como a esferificação para criar seus experimentos. No Oro, seu restaurante, faz algo parecido. Com a diferença de ser observado ao vivo atrás da parede de vidro que separa a cozinha mirabolante do salão. Avistá-lo em ação quase equivale a um show de efeitos especiais que dá origem a pratos como tempura de ovos de codorna e ar de trufas, servido com gemas moles em uma típica caixa de ovos, e a mistura intrigante de açaí salgado, banana confit e crocante de tapioca, polvilhada com pó de foie gras gelado. Rua Frei Leandro, 20, 21/2226-4586; Cc: A, D, M, V)
Felipe Bronze trabalhando no Oro – Foto: Leo Feltran
Irajá Gastrô
É comandado pelo jovem Pedro de Artagão, ex-chef do premiado Laguiole. Aberto em 2011, o Irajá acomoda seus clientes no salão e também em uma disputada antessala, decorada com mesinhas baixas e poltronas retrô. Uma vez ali, peça a salada caprese, que leva diferentes tipos de tomate, mussarela de búfala na forma líquida, farofa de croûtons e manjericão, e o galinheiro, um ovo caipira semicozido, servido com curau de milho doce, crocante de canjiquinha e glacê de galinha caipira. (Rua Conde de Irajá, 109, 21/2246-1395, irajagastro.com.br; Cc: A, D, M, V)
+ Novidades
ALLORO No térreo do hotel Windsor, o Alloro é regido pelo italiano Luciano Boseggia, ex-Fasano. Em sua primeira investida no Rio, Boseggia serve pratos italianos com forte presença de peixes e frutos do mar. O tortelli recheado de abóbora assada vem coberto por molho de camarão e amêndoa. (Avenida Atlântica, 1020, 21/2195-7800; Cc: A, D, M, V)
LA BICYCLETTE Tendência carioca, é um misto de boulangerie com fast food francês. Tem pães artesanais na pedra logo cedo e saladinhas com croque monsieur na hora do almoço. (Rua Pacheco Leão, 320, 21/3256-9052, labicyclette.com.br; Cc: M, V)
BOULANGERIE GUERIN Azulejos franceses e baguetes com o timbre de Dominique Guerin, que chefiou a pâtisserie do Hotel Sofitel por 11 anos. (Avenida Nossa Senhora de Copacabana, 920, 21/2547-1326, padariaguerin.com.br; Cc: M, V)
Os neobotequins
Stuzzi
Tem a melhor cozinha entre os neobotecos, ou gastrobares, bares de tapas que surgem com força no Rio – tendência na cidade, assim como as boulangeries. Comandada pela paulista Paula Prandini, ex-Le Pré Catelan, serve “tapas italianas”, porções diminutas que podem conter grissini de polenta com chutney de tomate e molho de gorgonzola. (Rua Dias Ferreira, 48, 21/2274-4017; Cc: A, M, V)
Meza Bar
É um dos primeiros gastrobares no Rio. A comida é servida em bowls coloridos: verde para saladas, laranja para massas e risotos, vermelho para carnes e peixes. Comece com a caipirinha de melancia com cardamomo e manjericão. (Rua Capitão Salomão, 69, 21/3239-1951, mezabar.com.br; Cc: A, D, M, V)
Q Gastrobar
Moderninha, a casa tem mesinhas disputadas na varanda voltada para a Dias Ferreira. O menu do chef Ronaldo Canha inclui porção de ostras gratinadas, tartar de peixe e polvo em creme de alho e páprica. (Rua Dias Ferreira, 617, 21/2113- 0564; Cc: D, M, V)
Entretapas
O chef Jan Santos estudou gastronomia na Catalunha antes de abrir o bar. Tapas tradicionais, como tortilla de batata e croqueta de presunto cru, vão bem com as cavas, as cervejas e a sangria à base de vinho seco. (Rua Conde de Irajá, 115, 21/2537-0673, entretapas.com.br; Cc: A, M, V)
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