Nova Zelândia: tudo sobre Auckland, Queenstown e Milford Sound
Acolhedora, vertiginosa, ecológica, cafeinada. Atravessamos o mundo para ver o que é que a terra dos maoris tem
“Caros passageiros, em minutos pousaremos na Nova Zelândia. Por favor, queiram atrasar seus relógios em 30 anos.” A piada, supostamente inventada por um australiano, revela uma daquelas rixas que vizinhos adoram cultivar – vide paulistas e cariocas, londrinos e parisienses.
Mas parece mesmo haver algo de datado, ou que se vive em outro tempo, nesta nação distribuída entre duas ilhas, onde seus 4,8 milhões de habitantes se autodenominam kiwis, um pássaro desengonçado e quase extinto. Um país onde nos aeroportos não existe separação entre a esteira de bagagem e a porta de saída.
É também um país onde as pessoas não vivem apressadas, não bufam quando um grupo de turistas barulhentos se manifesta mais do que devia, não atendem um cliente com simpatia fora do comum só porque estão interessados na gorjeta, simplesmente porque a gorjeta não é um costume local. Bem-vindo, leitor, a um país fora de moda.
AUCKLAND: NÃO CONTÉM GLÚTEN
A maior cidade da Nova Zelândia está longe de ser o que se pensa de uma cidade grande. Esteja onde estiver em Auckland, você estará sempre a 15 minutos de caminhada do seu destino.
Ao menos na parte turística, essa regra se aplica. Com população de 1,5 milhão de pessoas, o equivalente a Belo Horizonte, suas ruas centrais nunca parecem conhecer a pressa, o buzinaço, o vuco-vuco, a impaciência. Basta andar pela artéria principal, a Queen Street, em um dia de semana para sentir-se no Centro de São Paulo num sábado de manhã.
De qualquer ponto da Queen se avista o cartão-postal da cidade, a Sky Tower. Você pode ter uma vista 360° do seu ponto mais alto, a 220 metros do chão e, se preferir turbinar sua visita com alguma dose de adrenalina, poderá andar sobre uma plataforma de um pouco mais de 1 metro de largura na parte externa.
O risco, claro, é calculado. Você coloca um macacão laranja, seu corpo é atado por cabos que por sua vez vão presos a um trilho acima da cabeça. Quem preferir literalmente se jogar pode pular lá de cima no SkyJump, que tem um mecanismo de cabos laterais que faz com que você desça retinho e pouse suave, ou seja, é menos radical que um bungee jump. Fique atento à neblina, que pode chegar de repente e miar o programa.
Em frente à Sky Tower está o Depot Eatary and Oyster Bar, restaurante do chef Al Brown, mas é bom saber que o lugar vive cheio. Uma alternativa astral, a um pulo da Sky Tower, é o café Scarecrow, que tem um cardápio no melhor estilo do país: orgânico, biológico, fresco, sem glúten, justo e direto do produtor.
Para chegar ao café, pegue a Victoria Street em frente à torre, atravesse a Queen e ande até a outra esquina. Você estará de cara para o Albert Park, que é vizinho da contígua Auckland Art Gallery Toi o Tamaki. O teto da entrada recria copas de árvores que estão apoiadas sobre finos pilotis ricos em entalhes, um trabalho inspirado na arte dos maoris, o povo indígena da Nova Zelândia. Para se aprofundar na cultura maori, não perca o gigantesco Auckland War Memorial Museum.
Paralela à rua do Albert Park, a High Street traz uma seleção de grifes locais. A rua também é cortada por vielas onde estão pretextos ótimos para beber e petiscar, caso da Vulcan Lane, que tem o Vulture’s Lane Craft Beer, de cervejas artesanais, e o The Occidental, que serve enormes potes de marisco ao bafo.
Um pouco adiante na High Street está o hotel DeBrett, que faz jus à classificação boutique. No pátio interno coberto por um teto de vidro funciona um aconchegante e imperdível restaurante.
Em frente, siga pela Fort Lane até chegar a Britomart, região onde se espalham 18 edifícios recuperados que abrigam as melhores lojas da cidade. Enfronhe-se pela Gore Street e deixe-se levar pelas vitrines e pelo burburinho vindo dos bares.
De Britomart você está a um pulo do ferry building, de onde saem os barcos de passeio para Waiheke Island (veja a seguir) e Rangitoto, uma surpreendente ilha vulcânica. Bater pernas por ali, beirando a marina, vendo uma quantidade enorme de veleiros atracados, é uma delícia.
Mais adiante você chegará ao Wynyard Quarter, onde há ótimos restaurantes, como o Baduzzi, e também um variado mercado de peixes (se houver petiscos de salmão defumado com mel e limão para degustar, não hesite).
Uma incursão bacana para além do Centro é embarcar em Britomart no ônibus 274 ou no 277 e descer no Mount Eden. No passado Auckland já foi um campo minado de vulcões em atividade, e lá você poderá ver cones adormecidos e ter uma vista daquelas.
WAIHEKE ISLAND: ENTRE NESSA FESTA
Apenas 40 minutos de ferry boat separam Auckland da imperturbável Waiheke, uma ilha onde vivem 9 mil sortudos. Ao longo de 19 quilômetros de extensão se espalham 24 vinícolas-boutique com produções pequenas e que raramente são vendidas fora do país.
O modo de usar para quem está sem carro, ou não quer dirigir na mão-inglesa, é agendar com antecedência um day tour com um receptivo como o Ananda, que espera você no atracadouro do terminal Matiatia. Quem preferir passar uma noite na ilha, decisão das mais acertadas, tem à disposição hospedagens excelentes.
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A geografia de Waiheke é de cair o queixo. Sua costa todinha recortada resultou em muitas enseadas, cerca de cinquenta, que surgem a todo momento. Você sai de uma, sobe uma colina e do alto depara com mais outra(s), alguns metros abaixo, banhada por um mar turquesa.
Enquanto o carro vencia uma ladeira logo depois de passar por Oneroa, o centrinho da ilha, eis que surgiu a paisagem mais fotogênica do dia. Uma placa de madeira indicava “Route to Little Palm Beach”, logo atrás uma trilha descia em ziguezague até sumir na mata fechada, e ao fundo se via a vizinha e linda Palm Beach.
No quesito vinícolas, se quem acha que viu uma viu todas, aqui terá uma bela surpresa. A Stony Ridge é uma das mais aconchegantes. As mesas do restaurante ficam sob um parreiral que ocupa boa parte dos fundos da construção. A festa de Réveillon mais fervida da ilha acontece ali, com uma vibe que já ganhou o nome de Waibiza, Waiheke + Ibiza, com direito a fogos, DJs, performances e bons drinques.
A Mudbrick, no alto de uma colina, é uma das mais disputadas e abriga dois restaurantes, sendo um deles mais caro e formal, e um bistrô com mesas externas de onde se avistam lindos arbustos e lavandas. Um cenário que poderia estar na Provence não fosse a vista para o Golfo de Hauraki e o skyline de Auckland.
A vinícola Te Whau tem um afamado restaurante, e seu prédio principal, por estar na parte alta do terreno, serve de mirante para os parreirais e a baía coalhada de barquinhos. E não para por aí: na Peacock Sky, a proprietária Connie, uma simpática canadense, harmoniza a degustação com beliscos.
A Batch Winery fica no ponto mais alto da ilha, de onde se tem uma visão 360°. A Man O’War, no extremo leste, longe de tudo, tem localização matadora. O acesso é por estrada de terra e, por estar à beira-mar, o lugar tem um jeitão de casa de praia.
A ilha também possui cerca de 20 mil oliveiras, e um dos produtores de azeite de oliva, a Rangihoua, quase ao lado da Batch, recebe visitantes e promove degustações. Nos meses de abril e maio, época da colheita, é possível acompanhar o processo de extração dos frutos. Definitivamente, um dia é pouco para Waiheke.
Cafeína na veiaUm fenômeno curioso no país é o boom de cafeterias: os neozelandeses são ávidos pela bebida e, mesmo sem plantar um grão sequer, estão entre os maiores consumidores mundiais per capita – eles estão 16 posições à frente do maior produtor mundial, o Brasil. Uma invenção local, mas que também é reivindicada pela Austrália, é o flat white, uma variação do latte servido numa xícara menor, com menos espuma (um barista kiwi odiaria tal definição). Lugares para um bom café: em Auckland, o RED, no Mt. Eden; em Wellington, o Havana Coffee Works; em Queenstown, o Vudu Cafe & Larder. |
WELLINGTON: HOLLYWOOD É AQUI
Uma hora depois de embarcar em Auckland, aterrissei no extremo sul da ilha norte, na capital do país. Ou seria na Terra do Meio? Já no aeroporto tive a certeza de estar pisando na casa dos personagens das trilogias O Senhor dos Anéis e O Hobbit.
No saguão de desembarque, somos recebidos por uma águia pendurada no teto de 1 tonelada e 15 metros de envergadura sendo “cavalgada” pelo mestre Gandalf e também por um expressivo Gollum catando peixes.
Wellington sedia estúdios de cinema que colocaram as paisagens da Nova Zelândia no imaginário mundial, tanto que a cidade ganhou o apelido de Wellywood. A Hollywood kiwi se estabeleceu na Península Miramar, a 10 minutos do Centro, aonde muitos vão para conhecer a Weta Cave, lugar onde estão expostos objetos que foram criados para filmes como King Kong, Avatar, As Crônicas de Nárnia e tudo do universo dos hobbits.
No tour de cerca de 1 hora em um casebre de madeira, uma competente guia mostra objetos utilizados em cena – roupas, máscaras, armas, próteses – e dá detalhes sobre a artesania por trás de cada peça. Só quem for um aficionado por aqueles filmes é que acreditará ter investido bem os 25 dólares da entrada.
Mesmo sendo a capital de um país e sede de uma indústria cinematográfica em ascensão, Wellington tem cara e ritmo de cidade do interior. Com cerca de 500 mil habitantes e um Centro ainda menor que o de Auckland, é também um lugar onde celebridades pagam de mortais
Foi assim, pelo menos, enquanto eu jantava no simpático Egmont Street Eatary e comecei a escutar uma voz rouca e inconfundível na mesa da frente. Era, apenas, Scarlett Johansson. Eu soube pelo garçom que ela estava na cidade havia cinco meses filmando Ghost in the Shell e que andava por aí sem causar alarde.
O centro “nervoso” de Wellington se desenvolveu nas proximidades de uma enseada e se espalha por colinas. Um tour por ali precisa incluir a alternativa Cuba Street, com seus sete quarteirões de lojas de objetos de decoração vintage, roupas de segunda mão, produtos naturais, artistas de rua e boemia.
Paralela à Cuba está a Hannah’s Laneway, uma viela onde pequenos negócios surgem a todo momento, como o Six Barrel Soda, um bar que produz sodas deliciosas (prove a de feijoa, uma fruta local), e o simpático Fix and Fogg, uma janela que a vendedora abre a cada cliente que se aproxima para oferecer provinhas de manteiga de amendoim.
Dois programas são fundamentais em Wellington: subir de bonde até a estação Kelburn Lookout, de onde se tem uma panorâmica da cidade, e descer pelas alamedas sinuosas do jardim botânico até chegar à estufa.
Na sequência, cruzar o cemitério-parque Bolton, atravessar a ponte de pedestres sobre uma autopista e descer de volta para o Centro. O outro programa é visitar o Museum of New Zealand Te Papa Tongarewa, que vai encantar muito as crianças (de qualquer idade). Um dos hits é uma casa que simula um terremoto, sina trágica do país.
Eu já tinha ouvido falar que Wellington é uma das cidades mais ventosas do mundo, mas, como já era o meu segundo dia na cidade e nada fora do comum aconteceu, achei que não passava de uma lenda urbana.
Até que, ao andar pela Lambton Quay, a principal rua de comércio do Centro, vi que a coisa não era brincadeira. A ventania vinha em rajadas. Cenas daquela tarde de maio: uma senhora abraçando um poste para não cair, um senhor trocando as pernas como se dançasse o twist, uma menina com o cabelo inteiro cobrindo o rosto num efeito capacete e eu andando em ziguezague tentando chegar logo ao hotel.
À noite, indo jantar, eu atravessava uma rua quando uma rajada de vento me brecou. Fiquei parado alguns segundos naquela situação ridícula, como se estivesse subindo uma escada imaginária sem sair do lugar. No meu quarto no Museum Hotel, de frente para a beira-mar, o vento entrava uivando pela tubulação do ar-condicionado.
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Na manhã seguinte, o concierge contou que os ventos da noite anterior chegaram a 150 quilômetros por hora e que isso era raro. Durante metade do ano as ventanias atingem facilmente os 60 quilômetros por hora. A razão de Wellington ser quase como um funil é a abertura de mar que existe na separação entre as ilhas Norte e Sul. O lado bom: o ar é um dos mais puros do planeta.
Ééé!!! Sauvignon!!!A prestigiada região vinícola de Marlborough pode ser conhecida em um dia a partir de Wellington. A cênica travessia para a Ilha Sul, passando por fiordes, é feita em ferries da Interislander, que vende um pacote que inclui a viagem (3h30 o trecho) em barcos confortabilíssimos, mais um tour da Sounds Connection por três vinícolas e uma loja de chocolates estupenda, a Makana (Macadamia Butter Toffee Crunch, anote esse nome). Vinícolas para ter no radar: Framingham, Nautilus , Brancott Estate, Yealands Estate, Cloudy Bay e Hans Herzog. Se preferir passar a noite, o Lochmara Lodge fica isolado entre os fiordes. |
QUEENSTOWN: CORAÇÃO NA BOCA
Uma cidade de 13 mil habitantes e que recebe a cada ano quase 3 milhões de visitantes. O fenômeno Queenstown acontece graças a uma rara combinação de isolamento, paisagens de cair o queixo, um menu variado de esportes radicais e excelente infraestrutura.
Quem primeiro desbravou a região foram mineiros em busca de ouro, no fim do século 19, vindos da Escócia, da Inglaterra e da Irlanda, mas que acabaram cortando um dobrado para conseguir sobreviver às agruras do clima e às adversidades do relevo.
Superadas as dificuldades, motivos para ficar não faltaram. Queenstown está assentada numa das regiões mais bonitas do país, à beira de um imenso lago, o Wakatipu, e cercada por uma magistral cadeia de montanhas, as Remarkables.
Seu minúsculo e vibrante centrinho vive em função do turismo e está repleto de lojas, restaurantes, agências de passeios, mas há poucos indícios históricos das primeiras ocupações.
O passado da região está muito bem preservado em um vilarejo a 20 quilômetros da cidade, em Arrowtown. O caminho pela Gorge Road reserva uma sucessão de paisagens de cartão-postal com centenas de carneiros pastando pelos campos. O gracioso vilarejo de Arrowtown mais parece uma locação de cinema envolta por uma natureza espetacular.
Na Buckingham Street, um pequeno museu conta detalhes da época da corrida do ouro e há também muitas lojinhas, dentre elas a Jade & Opal Factory, de pedras preciosas. Busque pelo The Chop Shop quando quiser fazer uma pausa para um café ou um almoço.
Outros 20 quilômetros e se chega à Ponte Kawarau, onde em 1988 um sujeito chamado A.J. Hackett resolveu prender os pés a uma corda e se jogar de uma altura de 43 metros, inaugurando a saga do bungee jump comercial no mundo. Um bem montado receptivo junto à ponte, com loja e café, recebe os visitantes, que hoje podem optar também por uma tirolesa. Mas o Kawarau nem é o bungee mais radical.
Treze quilômetros adiante, sobre o leito do Rio Nevis, uma plataforma afixada por cabos a dois despenhadeiros é o que se pode chamar de animal: o mergulho se dá a uma altura de 134 metros, o mais profundo do país.
Mas ninguém precisa passar as férias com o coração na boca, há outros passeios com boas doses de deslumbramento e mínimas de adrenalina. Um dos mais procurados é o que uma agência de Queenstown vende como Dart River Jet Wilderness Safari, que começa com um transfer panorâmico beirando o Wakatipu por 48 quilômetros até chegar a Glenorchy, um vilarejo charmosinho com paisagens estonteantes.
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Conhecemos locações de filmes e embarcamos em lanchas rápidas que seguem rio adentro e chegam próximo a cavernas e cachoeiras despencando de paredões.
O cenário mais bonito de Queenstown custa uma cifra de qualquer passeio, e a lembrança é indelével. Você embarca num bondinho que vai 456 metros montanha acima, de onde se tem uma visão arrebatadora das Remarkables e do Wakatipu.
Lá do alto você pode percorrer um circuito a bordo de carrinhos de rolimã gourmetizados, voar de parapente, pular de bungee jump, todos programas pagos à parte. Mas, se não quiser fazer absolutamente nada, ou apenas sentar no bar em frente aos janelões e pedir um vinho, tenha a mais absoluta certeza de que você estará fazendo o melhor programa que existe em Queenstown.
Real belezaA Nova Zelândia não só preza e se orgulha da natureza que tem, mas também faz dela um diversificado mercado de alimentos e produtos de beleza. As lojas das cidades e dos aeroportos são variadíssimas: placenta de ovelha em cápsulas, lama geotérmica, máscaras faciais de kiwi, hidratantes de lanolina (óleo da lã de ovelha), e por aí vai. O caro e saboroso mel de Manuka tem tantas propriedades medicinais que é praticamente um levanta-defunto. O spray da Fess, apesar de australiano, é uma bênção pra secura das cabines de avião. Algumas marcas de cosméticos famosas: Antipodes, Trilogy, Plantae, Eco Store, Living Nature e a popularíssima Wild Ferns. |
MILFORD SOUND: O ARREBATAMENTO
Os fiordes da Nova Zelândia são um soco no estômago, um dos cenários mais singulares do mundo. Muitos turistas, sem dúvida a maioria, cometem o equívoco de conhecer Milford Sound partindo de Queenstown em um bate e volta. Só de ida são 4 horas, mais 2 de barco pelos fiordes, e você conta aí umas boas 10 horas se deslocando.
O melhor jeito é transferir a sua base para um microvilarejo no meio do caminho que se chama Te Anau, onde você pode dormir e aproveitar a noite para fazer uma visita à Caverna das Larvas Luminosas.
O passeio consiste na travessia de um lago a bordo de um barco até chegar à outra margem. Dali se entra em uma caverna molhada. Torça para que tenha chovido, não a ponto de impedir o passeio, o que eventualmente acontece, mas é porque, quanto maior o volume de água, mais impressionante fica.
A caverna é estreita, tem teto baixo, e uma passarela segue junto ao leito do rio, que corre com uma força descomunal formando cachoeiras e sorvedouros. O ápice é no ponto em que não havia mais luz, e subimos em um barquinho que nos conduziu caverna adentro no mais absoluto breu.
Aos poucos, no teto, pontinhos de luz começaram a se acender e apagar. São larvas que ficam ali se alimentando por até um ano antes de se transformar em insetos. Quanto mais esfomeada a larva estiver, mais ela brilha.
No dia seguinte, faça o percurso de 120 quilômetros até Milford Sound como deve ser: devagar e sempre parando. Foi com que esse espírito que Geoff, o excelente guia da Trips & Tramps, conduziu a van comigo e mais um casal da Malásia.
Paramos nos Mirror Lakes, lagos que refletem os picos nevados como um espelho, no The Chasm, um lugar onde as pedras foram esculpidas pela força da água do Rio Cleddau, e por vários outros recantos. Em certo ponto paramos para abastecer nossas garrafinhas com água do rio, quando surgiu ao meu lado um kea, o único papagaio alpino de que se tem notícia e que se aproxima sem cerimônia em busca de comida (nunca dê).
Ao chegarmos ao atracadouro de Milford Sound, eis que surge a paisagem magnífica do Mitre Peak, o pico de 1692 metros de altura que já é quase um ícone do país. O barco sai do píer e circula por um imenso lago que foi invadido pelo Mar da Tasmânia e está cercado por paredões verticais abruptos de alturas impensáveis. Alguns são forrados por florestas, e a chuva e o degelo ininterrupto formam cachoeiras, algumas tão fortes que dão um banho em quem se arrisca a fotografá-las da proa do barco.
Aquela viagem estava terminando, e eu ainda tinha um longo caminho de volta para Auckland e depois para o Brasil. Pensei que, se fosse possível modificar alguma coisa na Nova Zelândia, seria trazê-la mais pra perto. Apesar de que o país só é o que é porque está longe de tudo.
Expectativa: ver maoris. Realidade: só vi chineses
Uma das expectativas que eu tinha antes de chegar à Nova Zelândia era encontrar pelas ruas os descendentes dos índios maori. Topei com muito poucos. Se tivesse ido a Rotorua ou para a costa leste da Ilha Norte, provavelmente eles seriam maioria.
Em compensação, vi muitos chineses, muitos. Chinês, na Nova Zelândia, é que nem brasileiro em Miami em priscas eras de dólar 1 pra 1. Eles são o segundo maior mercado emissor de turistas depois da Austrália.
Quanto mais eu me afastava de Auckland e Wellington achando que estaríamos apenas eu e a natureza selvagem, sempre surgiam, nem um nem dois, mas pelo menos 40 chineses. O jeito gregário deles de ser faz com que o ônibus de excursão seja o meio de transporte mais óbvio. Foi assim em Milford Sound e também em Queenstown.
Há muito que os chineses tomaram o lugar dos japoneses como os turistas que mais fotografam a vida. Na caverna de Te Anau, eu era o único não oriental dentro do barquinho que nos levou para ver as surreais larvas que piscam. Na saída, perguntei a uma jovem o que ela tinha achado, e ela disse: “So so”. “Why?”, questionei. “Because no picture”, lamentando a proibição de fotografar.
Os aeroportos da Nova Zelândia já se tornaram territórios binacionais: placas e etiquetas em caracteres chineses, vendedores falando mandarim, mas, como o sentir-se em casa tem limites, as lixeiras exibem o aviso: “Não cuspa. Use o banheiro”.
Eles são a nova fronteira da economia do país e talvez em nenhum outro lugar do mundo sejam tão bem tratados. Enquanto em Londres as pessoas são capazes de xingar até a quinta geração quem ficar parado à esquerda de uma escada rolante, a paciência e a gentileza fazem do neozelandês o verdadeiro homem cordial. Sorte dos chineses. E de todos nós.
Guia VT
Auckland
Ficar
O DeBrett é um boutique de ótimo gosto e com um restaurante que vale a pena. O Sky City Grand está colado à Sky Tower. O Shakespeare Brewery & Hotel, com dez quartos simples, tem dois pubs e produz a própria cerveja. O hostel City Garden Lodge funciona em uma casa de estilo vitoriano próxima ao Centro.
Comer
O carro-chefe do consagrado Baduzzi são as almôndegas, como a de lagostim com pancetta e pecorino. De cozinha contemporânea, o Clooney tem menu degustação com sete pratos. O Crab Shack, junto à marina, é especialista em frutos do mar. Os 13 restaurantes do Elliott Stables ficam dentro de um antigo estábulo.
Passear
A subida à torre Sky Tower custa NZD 36 (por NZD 4 a mais você pode subir duas vezes no mesmo dia). Saltar no SkyJump (NZD 225) ou andar sobre a plataforma SkyWalk (NZD 150) é adrenalina na certa – o combo das duas sai a NZD 295. O War Memorial Museum tem duas galerias dedicadas aos povos polinésios, com mais de 2 mil objetos, incluindo uma autêntica casa cerimonial maori, canoas de guerra e magníficas esculturas entalhadas em madeira do século 12. O The Big Foody oferece seis excursões pela culinária de Auckland.
Waiheke Island
Ficar
Os cinco quartos do luxuoso Delamore Lodge têm varanda com vista para o mar e chef à disposição. No The Boatshed, os cinco quartos e dois bangalôs também têm vistas garantidas. O B&B Kiwi House fica próximo de centrinho de Oneroa.
Comer
As refeições servidas na vinícola Te Whau vêm com vista para Auckland. Na Peacock Sky, as mesas ficam junto aos parreirais. Reserve em ambas.
Passear
O ferry de Auckland para Waiheke leva 40 minutos entre ida e volta com a Fullers. A empresa também oferece diferentes passeios de um dia em ônibus pela ilha. Na Ananda Tours, as excursões são personalizadas, como a The Wine Connoisseur’s, que passa por três vinícolas da ilha que o cliente elege.
Wellington
Ficar
O Museum é um hotel de design de frente para a baía e o Museu Te Papa. Mais intimista, The Wellesley fica em um prédio histórico. No hostel YHA Wellington há quartos compartilhados e duplos.
Comer
Com vista para a baía, o Poneke by Mojo tem um espaço descontraído e serve vinhos e cervejas locais. No descolado Egmont Street Eatary, o menu muda a cada semana. No WBC, a especialidade são os frutos do mar.
Passear
Os seis andares do Te Papa merecem uma tarde inteira, e paga-se entrada somente para exposições temporárias. A 10 minutos de táxi do Centro, o Zealandia é uma reserva onde se recriou a natureza do país antes da ocupação humana. Os bichos ficam soltos, e com sorte você consegue ver kiwi, o pássaro, no passeio noturno.
Queenstown
Ficar
O luxuoso St. Moritz tem vistas panorâmicas para o Lago Wakatipu e as montanhas. Nada pode ser mais aconchegante e informal do que o The Dairy, a um pulo do bondinho. O Centro tem bons hostels, como o Nomads e o Adventure Q2. Em Glenorchy, o Blanket Bay é um refúgio chique com vistas estonteantes para o lago.
Comer
Praticamente uma Times Square, o Fergburger é o epicentro da cidade, daqueles lugares em que o mito que cerca sua história é maior do que o produto em si, no caso os hambúrgueres, que são o.k. Culinária superior é a do Vudu Café, que serve sopas, quiches e sanduíches divinos. Se a noite pedir um upgrade elegante, o Rata e o Botswana Butchery cumprirão a função.
Passear
O Bungee Jump pode ser realizado nas pontes Kawaraue, o mais vertiginoso, sobre o Rio Nevis. A Black ZQN faz roteiros sob medida com guias excelentes em sedãs de luxo. O Dart River Wilderness Jet leva até Glenorchy para um passeio em potentes jet boats com direito a cavalinhos de pau. A Around the Basin aluga bicicletas e conduz passeios por extensa malha de ciclovias.
Te Anau/Milfordsound
Ficar
O Radfords on the Lake, em frente ao lago de Te Anau, faz a linha motel americano e tem apartamentos com cozinha.
Comer
O Redcliff Cafe serve ótima carne de cervo.
Passear
A Caverna das Larvas Luminosas pode ser conhecida todos os dias em sete horários. A Trips & Tramps organiza tours para Milford Sound em grupos pequenos saindo de Te Anau. Entre novembro e abril você pode fazer o tracking de quatro dias até Milford Sound, um dos melhores do mundo (prepare-se pelo site https://www.freewebs.com/masonborosound/).
O site fiordland traz todas as opções de cruzeiros por Milford Sound. A Real Journeys leva para o Doubtful Sound, um fiorde majestoso, maior e mais isolado do que Milford. O passeio dura 8h, e o trajeto inclui barco e ônibus até chegar ao fiorde.
Quando ir
A Nova Zelândia vive as estações do ano simultaneamente com o Brasil. O melhor é pautar a sua viagem pelo clima de Queenstown, que tem sua melhor temporada para passeios de bicicleta e lancha entre dezembro e abril. A partir de maio a temperatura pode cair para 1 ºC. De 20 de dezembro a 10 de janeiro é quando os neozelandeses tiram férias e costumam lotar os hotéis.
O inverno é boa pedida para quem quer esquiar na Ilha Sul. Auckland, por estar ao norte, costuma ter temperatura mais altas, com um média de 20 ºC no verão e 12 ºC no inverno. Em Wellington costuma ventar menos no verão, enquanto que outubro e novembro são meses com rajadas constantes – algumas de derrubar.
Dinheiro
Dólar neozelandês. Dólares americanos são fáceis de trocar.
Língua
Inglês.
Fuso
+ 15h.
Documentos
Desde outubro de 2019 brasileiros necessitam de uma autorização eletrônica para visitarem a Nova Zelândia que pode ser providenciada pela internet. Não é necessário agendamento de entrevista. A validade do visto eletrônico é de dois anos. Pode ser preciso provar na chegada ao país ter a passagem de volta, reserva de hotéis e o equivalente a NZ$ 1 000 para um mês de viagem.
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