Nas placas da estrada se lê: Romantische Straße, “Estrada Romântica” em alemão. Logo abaixo a tradução vem… em japonês! Bem se vê que o início de uns dos circuitos mais turísticos da Europa recebe muitas excursões do Japão e do mundo, incluindo jovens casais, grupos de aposentados e famílias com crianças. Todos buscam a mesma coisa nos 300 quilômetros do percurso: as fofuras das 28 cidades entre Würzburg e Füssen, na Bavária, sul da Alemanha.
Nascida nos anos 50 para levantar o moral do país e criar um turismo para vender uma Alemanha legal e alegre, a Rota Romântica não é, apesar disso, só marketing. É legal mesmo!
Viajar pelas estradinhas de mão única é um relax sem fim: elas são entrecortadas por suaves ondulações cobertas de vegetação, florzinhas amarelas e girassóis – sim, girassóis, como na Toscana.
A paisagem de calendário também tem cataventos e encantadoras vilas sem nome sinalizado. Besta de quem não dá um baile no GPS e não começa a se perder enquanto ele implora pra você voltar pro caminho original!
No sentido oposto ao habitual entre os turistas, fiz o roteiro de sul a norte, de Füssen a Würzburg, passando por Schwangau, Landsberg am Lech, Dinkelsbühl e Rothenburg ob der Tauber.
Eu sei, são muitas consoantes para poucas palavras, mas elas não mordem. Ao contrário: nessas microcidades, elas se multiplicam enquanto o inglês fica mais raro. Mas a simpatia, redobrada, deixa tudo muito simples.
Cinderela e Wagner
Füssen, no extremo sul, fica aos pés dos Alpes, cercada por lagos verdes e montanhas nevadas. O centro histórico é cheio de casinhas coloridas e prédios baixos, com telhadinhos íngremes para a neve escorregar com mais facilidade.
Ali se vê uma particularidade que se repete em outras cidades da Rota Romântica: as pinturas decorativas nas fachadas. São adornos, imagens referentes a fábulas locais ou simplesmente letreiros estilizados de lojas.
Minha guia, Silvia – uma alemã alegre, vestida de camponesa e usando duas trancinhas loiras –, disse que nem lhes ocorria fazer de maneira diferente. Ela já tinha me mostrado um dos castelo medievais mais bem preservados da Alemanha, o Hohes Schloss. De estilo gótico tardio, tem a fachada, as paredes do pátio interno e as torres pintadas de afrescos na técnica francesa trompe-l’oeil (algo como “engana o olho”), que é nada mais nada menos do que pinturas no lugar de janelas, molduras e portas.
Outra fachada que me chamou a atenção foi a da Heilig-Geist-Spital, a barroca igreja do Hospital do Espírito Santo, destruído por um incêndio. Uma joia do século 18 totalmente pintada em tons de terracota em estilo rococó.
Na vizinha Schwangau ficam os famosos e imponentes castelos Hohenschwangau, casa do rei bávaro Ludwig II na infância, e o portentoso Neuschwanstein, que arrasta milhares de turistas diariamente para visitas guiadas ao seu interior.
A fama se deve a dois fatos. Primeiro: foi ele que inspirou Walt Disney a criar o castelo da Cinderela. Segundo: é o resultado de todas as pirações arquitetônicas de Ludwig, que quis recriar em seus aposentos os temas de cavalaria, mitológicos, da obra do compositor alemão Richard Wagner.
As vistas das janelas para o vale são lindas – o danado do rei tinha bom gosto para locações. Os aposentos são requintados e muito bem preservados, mantendo o luxo e o brilho intactos. A sala do trono tem um piso com milhões de peças de um mosaico que está protegido por uma lâmina transparente. Pena que, depois de tudo, ele teve pouco tempo pra morar lá, só meio ano. Coisa, literalmente, de doido.
Do lado de fora, a melhor foto do castelo (e igualzinha a todas as outras do mundo) é feita da ponte Marienbrücke. Dá um nó no estômago ver tanta gente andando na estrutura de ripas espaçadas, de maneira que se podem perceber direitinho os 90 metros de distância que separam nossos pés do chão. Selfies lá podem sair trêmulos de medo.
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Landsberg am Lech, 75 quilômetros ao norte, é uma cidadezinha pacífica e silenciosa às margens do Rio Lech. Tanto que não dá pra imaginar Hitler preso ali por ter tentado dar um golpe de Estado em 1923, escrevendo um dos livros mais vendidos na história do mundo: Mein Kampf (“Minha Luta”).
Bom ali é ficar dando sopa na praça central, Hauptplatz, rodeada de lojinhas, ou zanzar por ruazinhas cheias de casas coloridas que mais parecem ser de Lego. Ou circundar as muralhas, aproveitando para ver as lindas vistas dos telhados vermelhos. Há de se ter coragem para encarar as pirambeiras.
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Gótico original
Dinkelsbühl, 146 quilômetros ao norte de Landsberg, é uma sobrevivente. Diferentemente de tantas cidades do país, não foi bombardeada na guerra. É original de fábrica. Medieval, murada e com 18 torres, exibe fachadas de madeira velhíssimas e jardins das casas de muros baixos impecáveis, floridos e cheios de penduricalhos.
Difícil andar 100 metros sem ver uma cadeira, um fogão ou qualquer objeto velho sendo usado como vaso de flores naturais, de pano ou madeira, pra enfeitar a fachada de uma casa, a entrada de uma garagem ou a porta de uma loja. E sobram cavalos, daqueles parrudos, fazendo passeios de charrete pela cidade. Os turistas amam!
O programa preferido dos visitantes é andar à toa pelas ruas cheias de lojinhas de artesanato – só é bom tomar muito (muito) cuidado pra não gastar mal o seu dinheiro com bobeiras importadas da China ou almoços em restaurantes pega-turista. Com um bom olho dá pra levar lindos enfeites de Natal e boas cervejas artesanais.
Mesmo que você esteja cansado de entrar em tantas igrejas Alemanha adentro, vale a pena conhecer a simplesinha Münster St. Georg, com seu lindo teto abobadado, um belo exemplar da arquitetura gótica.
Se você quiser dar um tempo no turismo alpino, a cidade abriga o Museu da Terceira Dimensão, com uma série de peças, truques e apetrechos ópticos. Má ideia para quem sofre de labirintite.
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Natal e Willy Wonka
Rothenburg ob der Tauber, mais 50 quilômetros na direção norte, é a mais popular dentre as mais populares paradas da Rota Romântica! É que ela é linda mesmo: as fachadas típicas alemãs, com placas e peças de latão, brilham de dia, de noite, o tempo todo! Todo mundo pira em frente às lojas com inacreditáveis vitrines com temas natalinos, como na Käthe Wohlfahrt Weihnachtsdorf!
Bonecos ou bichos de pelúcia pendurados em janelas tocam música e soltam bolhas de sabão pela ruas enquanto turistas enchem suas sacolinhas com as Schneeballen – as bolotas feitas de tiras de massa, fritas, misturadas com açúcar, chocolate, creme, geleia ou qualquer outra coisa doce. Especialidade da cidade. Japoneses (eles!) ficam hipnotizados em frente à Diller”s Schneeballen, onde há demonstração de como fazer o doce, o dia todo.
Dormir lá é uma ótima decisão, porque, quando o dia vai e a noite vem, as multidões dão no pé e quem fica ganha uma cidade totalmente diferente pra si! Um programa manjado, mas, sinceramente, muitíssimo divertido é fazer o tour com um personagem da cidade, o guarda noturno (Nachtwächter). É a cara do Willy Wonka.
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Todo dia, às 20 horas, ele sai da prefeitura da cidade, a Rathaus, com uma lanterna na mão, conduzindo os visitantes por ruas mal iluminadas e pelas muralhas da cidade. É um sucesso.
No mesmo clima, o Mittelalterliches Kriminalmuseum é um superbem montado museu que expõe instrumentos de tortura e desenhos com todos os tipos de métodos para causar dor e sofrimento. Pra quem gosta de temas inusitados, não é perda de tempo. Nem é pega-turista.
Vinho!
A 64 quilômetros de Rothenburg – e 325 desde o início da viagem – está Würzburg, a cidade na região vinícola da Francônia que inicia o roteiro romântico – ou, neste caso, finaliza. Ironicamente, é uma cidade maior, sem aquele jeitinho de Lego que a gente tanto vê no caminho todo.
Ela é famosa pelo Residenz, o grandioso palácio barroco do século 18 que servia à nobreza da região. Os 400 ambientes totalmente restaurados, cercados por jardins impecáveis, foram declarados Patrimônio da Humanidade pela Unesco. Porém, o encanto de Würzburg está em sua vivacidade, sua alegria e nas ruas (com os piores músicos e estátuas humanas que vi na vida).
A cidade tem uma ponte sobre o caudaloso Rio Meno, a Alte Mainbrücke. Nos dias quentes, os locais compram uma taça de vinho (de vidro), arranjam um canto nela e ficam lá, vendo o pôr do sol, ouvindo alguma música ou jogando o precioso tempo da maneira como ele deve ser desperdiçado.
Essa cena pode ser apreciada lá do alto, do Festung Marienberg, a fortaleza que se ergue entre morros de videiras. O barulho da cidade fica longe, a multidão na ponte vira um grupo de formigas, e a vida passa lá, devagar, até o sol cair pintando a cidade com arquitetura barroca de vermelho. Um perfeito The End.
Guia VT
Ficar
Em Füssen, o Luitpold- park faz o estilo clássico com móveis coloridos. Em Landsberg, o Schafbräu, no topo de um prédio residencial, tem um dono simpático e um restaurante no térreo. Em Rothenburg, o Goldener Hirsch tem quartos bem amplos.
Quando ir
A alta temporada vai de junho a setembro, quando as temperaturas estão agradáveis e a vida acontece ao ar livre. Entre março e maio há menos gente e o clima está bom.
Documento
O passaporte é necessário mas dispensa de visto, por até 90 dias.
Saúde
Nenhuma vacina específica é necessária para entrada no país.
Língua
Alemão.
Moeda
Euro.